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O Percurso da vida de um Caboclo Ribeirinho

 

A imagem retrata o texto que descreve o percurso da vida de um caboclo ribeirinho, o conhecimento adquirido ao longo da vida e o reconhecimento do caminho percorrido
Imagem: Via Pinterest

Toda vida é um percurso ao longo de anos, perdurando assim a vida do ser humano. A vida do caboclo ribeirinho está dentro desse perpassar da vida humana, porém carrega consigo algumas particularidades, como por exemplo: sua vida não é feita de certezas; é construída na lida diária com a terra, com a confiança das águas, no silêncio da floresta e na força das mãos calejadas. Esse percurso se revela aos poucos, no compasso do remo, no cheiro do mato molhado e no som dos pássaros que anunciam o amanhecer. Nele cada dia é único e traz consigo um ensinamento novo, mesmo que os gestos se repitam: no pescar, no remar, no plantar, no esperar e colher. 

Na beira do rio a vida é pulsante, e com sua particularidade vai moldando o viver do caboclo ribeirinho. A roça não é apenas o espaço do cultivo, mas um lugar de comunhão com a terra. Nela o caboclo semeia para colher o alimento que fortalece seu corpo e fortifica a alma. O Milho, a mandioca, a melancia, a banana, a macaxeira, o jerimum e feijão não nascem apenas da terra, mas também da esperança e da confiança do caboclo. O trabalho na roça exige paciência, fé no tempo e respeito ao ciclo da natureza. O caboclo aprende desde cedo que não se colhe antes do tempo certo, e que a terra responde melhor a uma trajetória do que à pressa, por isso ele espera confiante e respeitosamente pelo ciclo da natureza. 

Os rios e igarapés mostram que a pesca não é apenas um ofício, mas um modo de sobrevivência e sabedoria herdada. Em cada lago, igarapé, e cada curva do rio tem um segredo. O caboclo conhece os lugares onde os peixes “moram", entende o movimento das águas, sabe ler o céu para prever as chuvas. A canoa se torna sua companheira inseparável, nela ele desliza sobre as águas como quem caminha por um velho e conhecido caminho, mas nunca igual. Em cada percurso há um encontro diferente: com os peixes, com as águas, com o silêncio da mata e com a própria alma. 

É nesse vai vem da vida, percorrido entre a roça e o rio que o caboclo elabora, mesmo sem palavras requintadas a sua filosofia de vida. Ele aprende com a floresta que tudo está interligado, isso não é um mero conhecimento, mas uma espiritualidade. Ele não faz filosofia pelo conhecimento teórico dos livros, mas vive, e vivendo aprende um vasto conhecimento, no plantio, no saber popular medicinal e nos fenômenos naturais. Ao chegar em casa depois de um dia cansativo de trabalho, sentado na varanda de sua casa, olhando o pôr do sol refletindo nas águas, ele sabe, mesmo inconsciente da grandeza de tal saber, que é parte de algo maior, e assim contempla o criador absoluto. 

Esse percurso da vida do caboclo ribeirinho é feito de simplicidade, mas não de ignorância. É feito de memórias e de histórias que são contadas em rodas de conversas a luz da lamparina ou embaixo de uma árvore numa tarde ensolarada, ensinamentos que são transmitidos de pai para filho. Ao longo dos anos, o caboclo coleciona lembranças: a fartura de um dia de pesca, a alegria da colheita, a travessia difícil de uma enchente, a dor de uma perda, o sorriso de uma criança que aprende a remar, a nadar. Cada memória é uma marca em sua trajetória de vida, e mesmo que os dias não se repitam, cada um deles deixam algo – um aprendizado, uma emoção, um ensinamento silencioso. 

E assim, depois de percorrer anos de vida, o caboclo ribeirinho olha para trás e reconhece que o percurso não foi fácil, mas foi permeado de vivências verdadeiras, e nele, floresceram boas lembranças, amizades sinceras, e um saber que não se aprende na escola, mas na convivência com seus semelhantes e com a natureza. O caboclo sabe que sua trajetória de vida é única – assim como cada dia vivido à beira do rio. Sem saber da teoria de um filósofo que falou sobre a constante mudança, ele sabe, mesmo que sua consciência não acuse tamanha sabedoria, que a cada dia que ele se banha no rio a água não é mais a mesma, e ele também já mudou. 




Por: Sebastião Caldas

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3 Comentários

  1. Quem é ribeirinha, compreende perfeitamente esse lindo percurso. Até hoje sinto o cheiro das fibras lindas de juta e malva que meus pais produziam, cheiro de fumaça no peixe assado e aquele sabor inigualável de saboreá-lo com a farinha novinha. Meu pai esperançoso fazendo feixes e guardando as “manivas” para plantar quando saíssem novamente as terras e assim começar um novo ciclo.

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    Respostas
    1. São lembranças que se eternizam nas melhores memórias, fruto de uma construção de vida ao longo de anos.

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  2. Belo texto, você viaja na leitura parece que estar vivendo aquilo que diz o texto, bate a saudade profunda em quem já viveu essa realidade, o cheiro de mato com peixe e água o cansaço no final do dia mas com uma paz sem tamanho que o silêncio traz

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